sexta-feira, 13 de junho de 2014

Assim.

Ainda que me permita sonhar, olhando para trás concluo que pouco do que idealizei se concretizou. Enquanto estudante, talvez, imaginava que após o término da licenciatura e consequente mestrado iria lutar por um emprego estável no qual me iria manter largos anos com uma remuneração adequada. Com o fluir normal da idade, das experiências, dos novos conhecimentos, já com um pé de meia que bastasse, daria o passo da compra da minha primeira casa, do meu primeiro carro. Entrava, assim, meio em devaneio. Como se a vida fosse assim, tão literal, tão preto no branco, tão fácil e tão assente em regras impostas. Como se, na verdade, tudo obedecesse a uma lei em torno do que é material, como se fossem necessárias coisas, objectos, para preencher vazios. Percebi então que há planos que podem ser traçados, pelos quais se pode e deve lutar, outros, pelo contrário, não obedecem a uma ordem ou boa vontade. Percebi que um emprego estável, ainda que obrigatório, é difícil de alcançar e que, após tantas experiências, desempenhar funções em algo que se gosta verdadeiramente é uma dádiva pela qual agradeço. Percebi que a paciência é rainha em cena e que o mérito, ainda que árduo de definir, ainda pode ser recompensado. Afinal, a moradia com a qual sonhei é facilmente substituível por um apartamento T3 nos arredores da cidade. Entendi que até o mais pequeno cantinho se pode transformar em palácio com bom gosto e pormenores que fazem a diferença. Já o carro que se encontra estacionado na garagem, com trabalho árduo é uma bênção e com certeza que os futuros filhos não necessitam de se pavonear num topo de gama. Apercebo-me, com o passar do tempo, que ainda que tenha vontade de comprar mil e um trapos contidos nas colecções da estação, ainda que me morda para adquirir mais livros para decorar as estantes, ainda assim, constato que tudo isto que consegui atingir, ainda que um pouco ao lado dos sonhos cor-de-rosa de outrora, é demasiado efémero comparado com o amor que tenho ao meu lado. Mesmo contendo uma vontade inimaginável de conhecer mais o mundo, de manter acessos certos luxos que pesam no orçamento mensal, sou capaz de respirar fundo e sorrir. A uns meros anos dos trinta, considero-me uma afortunada: consigo visualizar um futuro. E isto, só por si, é mais do que suficiente. Revelo-me uma pessoa simples, nada mais.

Sim, permito-me sonhar. Agora a dois.
palavras  da Ana, que podiam ser minhas (se eu soubesse escrever assim).

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